A mãe que virou onça...
"Toda mulher
Vira bicho quando gesta
Vira bicho quando pare
Vira bicho quando mãe
Toda mãe
Vira bicho quando amamenta
Seu bichinho
Vira bicho quando precisa
Defender seu bichinho" *
Deus do céu, tem coisa que acontece que a gente só processa mesmo depois que passa.
Bom, vamos aos fatos...
Dia gostoso, calor, fim de tarde. Levo Maria Vitória para o clube. Encontro uma amiga com a filha também amiguinha de minha pequena e entramos na brinquedoteca para as crianças se divertirem.
Nem cinco minutos se passaram, Maria Vitória se distrai com uma casinha de bonecas. E eu ali do lado.
Mal pisquei e escuto um grito da Maria Vitória e quando olho ela está tremendo, em prantos, olhos arregalados e soluços. Nunca vi minha menininha chorar daquela forma. Um choro doído. Ela me agarrava e tremia.
Nessa fração de segundos com ela no colo, eu ainda não tinha entendido o que havia acontecido, quando de repente ouço uma moça atrás de mim falando "você bateu no rosto dela fulano?"...
Foi então que entendi que havia um garotinho abaixado dentro da casinha e quando Maria Vitória se aproximou ele bateu nela com um martelo de brinquedo e se escondeu novamente.
Me doeu tanto aquilo. Poxa, Maria Vitória é sempre tão carinhosa. A dona da simpatia tomando uma cacetada.
A babá então pegou o menino que devia ter uns três aninhos no colo, e eu, cega de susto ao ver o pranto da minha filha, perdi a noção e dei uma bronca no garoto.
Meu sangue subiu na hora. Virei bicho. E apertando Maria Vitória em meus braços eu gritei. "Você não pode bater nela"... Minha voz continha a fúria de uma mãe que tem a filha agredida de graça. Mas muito rápido (e graças a Deus), me caiu a ficha do "o que eu estou fazendo?" e eu completei a frase com um tom bem mais baixo (mas ainda cheio de raiva), "ela é amiguinha, você não pode bater nos amiguinhos".
Não vi para onde foi o menino com a babá. Me sentei abraçada a Maria Vitória que ainda chorava amargamente seu galo na testa e caí no choro com ela.
Demorou um tempinho pra gente se recompor... Tempo suficiente para eu processar um monte de coisas.
Me senti impotente por pensar que nem sempre poderei proteger minha pequena...
Me senti envergonhada por ter dado a bronca no menininho, que afinal de contas é uma criança e com certeza não fez nada calculado... Juro que no fim das contas isso me doeu um bocado também.
Me senti receosa em imaginar que amanhã ou depois pode ser a Maria Vitória no lugar do garoto, batendo em outra criança...
Me vi no lugar de outras mães que já critiquei por terem tido a mesma atitude que eu de chamar atenção dos filhos dos outros. Acho isso tão feio... Mas e aí? Quando a gente vê a dor de nossas crias acabamos perdendo a razão.
Justifica? Não, de forma alguma. Como agir?
O que quero passar para minha filha?
Vejo mães/pais que ensinam seus filhos a retribuírem a agressão. Já vi mãe sacolejando filho dos outros, assim como vejo aqueles que presenciam seus filhos batendo em outras crianças ou tendo atitudes agressivas e não fazem nada.
Ainda acho que a conversa é a melhor alternativa. Educar para a vida. Ensinar o que é certo. Ensinar o carinho e o respeito pelo próximo. Ensinar o perdão. Ensinar a sair de perto de crianças que batem e procurar um adulto. Ensinar o amor...
... E ter sabedoria suficiente para passar por estes momentos...
É... A difícil arte de educar.... E você, o que faria?
* trecho da poesia O corpo da mãe. Desconheço a autoria.